Projeto convida brasileiros a conversar sobre temas sobre os quais eles discordam, incentivando o diálogo para gerar tolerância e confiança
12/08/2024
Reproduzido da Folha de S. Paulo
Ao longo da última década, a política invadiu os lares brasileiros. Isso, por um lado, foi bom: afinal, política é exercício da cidadania, envolvendo a discussão sobre o bem comum e a busca por soluções coletivas para desafios que enfrentamos.
O problema, no entanto, é que essa política —que passou a dominar jantares em família, encontros entre amigos e feeds nas redes sociais, antes cheios de fotos de festas e viagens— estava contaminada pela polarização.
Fabiane, 41, começou a questionar seus sentimentos por um parceiro devido às divergências políticas. “Analisando, percebi que nem tenho convicções tão firmes assim. Embora procure me inteirar sobre o que acontece no cenário político, não é algo a que eu dedique grande parte da atenção. Ainda assim, a política impactou meu relacionamento”, conta.
Histórias como essa não são casos isolados. Existem hoje aplicativos de relacionamento que só aceitam pessoas de determinada ideologia política, refletindo a profundidade da polarização atual.
Essa polarização afeta também famílias, que se veem divididas com discussões acaloradas antes inimagináveis, e amigos, que rompem laços por causa de postagens nas redes sociais ou comentários em momentos de tensão.
Foi o que aconteceu com Odair, 49. “Sofro pelo fato de ter perdido amigos por ter opiniões diferentes”, afirma. Marcelo, 21, sente-se frustrado por só conseguir conversar sobre política com pessoas de opiniões parecidas, e, mesmo assim, de maneira superficial.
“Minha avó é uma das poucas pessoas próximas que têm uma visão política muito diferente da minha, mas não conversa comigo porque sempre brigamos quando entramos nesse tema. Eu gostaria de entender melhor o ponto de vista das outras pessoas e aprender a me comunicar com elas”, completa.
É natural pensar de formas diferentes: a chamada polarização ideológica faz parte do processo democrático. O problema surge quando divergências se transformam em desconfiança e conflito, dando origem à polarização afetiva, que dificulta a discussão construtiva, mina a coesão social e provoca divisões profundas na sociedade.
Para reverter essa tendência, é necessário fortalecer a cultura do diálogo. Saber ouvir pontos de vista dos outros e defender os seus é fundamental para evitar que relações sejam interrompidas pelo simples fato de que as pessoas pensam de formas diferentes.
Fabiane, Odair e Marcelo são participantes da iniciativa “O Brasil Fala”, colaboração entre o Instituto Sivis, a organização alemã My Country Talks e pesquisadores da Universidade de Stanford.
A proposta é conectar milhares de brasileiros em conversas sobre temas sobre os quais eles discordam, difundindo o poder do diálogo para gerar tolerância e confiança entre pessoas com ideias opostas.
Interessados devem se cadastrar neste site e responder a um breve questionário sobre temas relacionados a política, economia e sociedade. Um algoritmo combina inscritos com opiniões divergentes, e, em horário agendado, eles se reúnem virtualmente em encontros privados e sem moderação. O objetivo é demonstrar os efeitos do diálogo entre os participantes e na sociedade brasileira como um todo.
Superar a polarização exige esforço e comprometimento. Requer pessoas dispostas a ouvir e compreender o ponto de vista do outro, reconhecendo a complexidade das questões e a diversidade de experiências.
A construção de uma sociedade mais coesa e resiliente depende da nossa capacidade de cultivar respeito e compreensão mútua, mesmo diante das diferenças.
Leia mais em Folha de São Paulo: https://www1.folha.uol.com.br/colunas/papo-de-responsa/2024/08/brasil-precisa-dialogar-para-superar-polarizacao.shtml