Valores democráticos nas eleições municipais

A importância para a democracia brasileira do pleito que elege prefeitos e vereadores

 

Por Guilherme Melo de Freitas | Gerente de pesquisa do Instituto Sivis
31/01/2024 05:20
Reproduzido de JOTA

 

2024 é ano de eleições municipais. Por que esse acontecimento é tão importante para a vida de cada um de nós e da sociedade brasileira como um todo? Neste artigo, falaremos sobre isso e sobre a especial relevância da cultura democrática no âmbito dos municípios.

Retomando, em linhas gerais, os papéis das autoridades municipais, os prefeitos administram as cidades, sendo responsáveis pelo planejamento urbano, pela gestão dos serviços públicos — saúde, educação, transporte, etc. —, pela promoção do desenvolvimento econômico, além de representar os interesses do município perante outras esferas (governos estadual e federal, poderes legislativo e judiciário, outros municípios, setor empresarial, organizações da sociedade civil, etc.), o que também inclui buscar recursos para novos investimentos e projetos. Já os vereadores são os responsáveis por propor, discutir e votar leis, fiscalizar as ações do prefeito e dos demais órgãos municipais, acompanhar a execução do orçamento e participar ativamente do debate político da cidade.

Considerando esses papéis fundamentais das autoridades municipais, fica evidente que as eleições de prefeitos e vereadores são um momento decisivo, afinal, nelas cada eleitor têm a oportunidade de expressar suas preferências e direcionar o futuro de sua cidade, definindo os representantes políticos que se tornarão os atores-chave na condução e enfrentamento das questões públicas ao longo dos próximos quatro anos.

No entanto, a participação política dos cidadãos não deve se esgotar no voto, especialmente no que se refere às eleições municipais. Pois, considerando a centralidade do princípio da subsidiariedade — segundo o qual os indivíduos e seus diversos grupos possuem grande autonomia e protagonismo para agir e se associar em prol do bem comum —, o desenvolvimento social acontece primeiramente em nível local, pois é ali que as pessoas têm contato mais direto e concreto com as questões públicas e o capital social dos indivíduos é formado e fortalecido. Além desse aspecto, a capacidade de influência do cidadão no contexto de sua cidade é muito maior em relação às esferas estadual e federal. Por isso, para além da eleição, é crucial o engajamento permanente de cada um nas questões locais. Ou, em outras palavras, é essencial fomentar uma cultura democrática vibrante no âmbito dos municípios.

Nesse sentido, é muito positivo para as comunidades políticas locais que os cidadãos se engajem, por exemplo, em iniciativas que envolvam a mobilização entre os próprios atores da sociedade civil — associações, organizações não governamentais, movimentos sociais, entre outros —, promovendo assim um ambiente cívico participativo, de pessoas que se comprometem efetivamente com as questões referentes ao bem comum de suas cidades.

Outro aspecto da cultura democrática é a dimensão cognitiva, que diz respeito a conhecer e se interessar pelo funcionamento da política, bem como acompanhar os debates sobre os rumos da localidade em que se vive. Tal interesse cívico subsidia cada pessoa a desenvolver um repertório que sirva de base para exercer um papel mais ativo nos desafios públicos: por exemplo, no acompanhamento das promessas de campanha e dos planos de governo, a fim de monitorar se os compromissos assumidos diante da população estão sendo cumpridos, o que fortalece a transparência e a prestação de contas por parte dos líderes; ou ainda, numa contínua interação dos cidadãos com os representantes, o que contribui para a identificação de novos problemas e novas soluções.

É importante também pontuar que esse engajamento cívico não precisa ser necessariamente abordado apenas a partir da “boa vontade individual”. Como afirmaram os pesquisadores Ednaldo Ribeiro, Julian Borba e Mario Fuks, no artigo “Contexto Democrático, Escolaridade e Tolerância Política na América Latina” (Revista Latinoamericana de Opinión Pública, 2019), as habilidades cognitivas dos cidadãos são também desenvolvidas por processos de socialização e/ou instituições educacionais.

Nesse sentido, é positivo considerarmos mecanismos que incentivem uma participação cidadã mais efetiva, como fóruns públicos, consultas populares, canais digitais, etc. acessíveis, para que a população expresse suas demandas e preocupações e assim contribua concretamente para a tomada de decisões. Ainda sobre esse ponto, são bem-vindas iniciativas que colaborem para que cada um compreenda melhor as questões locais, conheça o funcionamento do governo e esteja ciente do impacto das decisões políticas em suas vidas cotidianas: por isso, escolas, organizações da sociedade civil e os próprios órgãos governamentais podem desempenhar papéis de destaque na promoção da cultura democrática.

Citando um tema correlato recente, há poucos dias, o TSE publicou uma resolução que aborda o uso de inteligência artificial na campanha de 2024. Para além das polêmicas envolvidas em relação à regulação, é importante enfatizar a importância central de eleitores bem formados que escolhem fontes confiáveis e saibam filtrar informações mentirosas. Nesse sentido, também neste tema das tecnologias, os cidadãos são responsáveis no cuidado diário com a democracia.

Por fim, além das virtudes cívicas já citadas, um município com pessoas engajadas se torna um ambiente propício à formação de melhores cidadãos, que exercitam e desenvolvem habilidades de liderança, negociação e resolução de problemas, assim como valores de confiança, solidariedade e cooperação, fatores que fortalecem a coesão social e favorecem o desenvolvimento de cada um. Esse ciclo virtuoso gera uma dinâmica mais colaborativa entre representantes eleitos e a comunidade, e no interior da própria comunidade, fortalecendo assim os alicerces da democracia local.

 

Foto de destaque: Marcelo Camargo/Agência Brasil.

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